terça-feira, agosto 26, 2008

Moradores do Bairro da Liberdade intimados a deixar as suas casas

«Câmara ordena desocupação em encosta instável e alega que não pode substituir-se aos senhorios no realojamento dos inquilinos»
Maria Emília Fortunato assoma por cima do muro e dispara: "Agora as casas são clandestinas. Mas para pagar às Finanças e o cano do esgoto nunca foram clandestinas."
A moradora no Bairro da Liberdade está entre a meia centena pessoas notificadas pela Câmara de Lisboa para que procedam à demolição das casas encavalitadas na encosta de Campolide.A ordem chegou no final de Julho. O ofício da Direcção Municipal de Conservação e Reabilitação Urbana só muda o nome e os números da porta.
O Laboratório Nacional de Engenharia Civil detectou "fenómenos de instabilidade que tendem a agravar-se" com chuvas prolongadas, "susceptíveis de colocar em perigo a integridade das construções e a segurança da população".
Por isso, recomendou a desocupação de uma faixa de 20 metros a contar da crista do talude, bem como de uma "zona de segurança" de dez metros na base da encosta junto à estação de Campolide. A fiscalização confirmou "danos e fendilhações" em edifícios e pavimentos. Veredicto? As construções "estão a contribuir para o agravamento da instabilidade da escarpa".Nos casos em que não se encontraram registos "da legalidade da construção", a câmara intimou para que sejam "despejadas" em 60 dias úteis.
Segundo o despacho do vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, "é intenção" da autarquia intimar os proprietários para demolir as edificações no prazo máximo de 90 dias."Aonde é que se arranja uma casa com as reformas que a gente tem?", questiona Emília Fortunato, 67 anos, atestados pelos cabelos brancos. A moradora nasceu na Rua Inácio Pardelhas Sanchez, em frente ao portão que dá acesso às "duas divisões e uma cozinha" onde agora mora.
Os dois filhos há muito que deixaram os modestos anexos na antiga Rua A. "Não saio daqui", vinca a sexagenária. Joaquim Fortunato, 72 anos, dá força à resistência da mulher e lamenta que sejam realojadas no bairro pessoas de outras zonas e se esqueçam de quem ali mora há mais de meio século."Isto parece uma multa aos inquilinos", indigna-se Isabel Santana, 69 anos. Mora nos Olivais, mas cresceu no Bairro da Liberdade. A irmã ainda habita os três anexos alugados pelos pais "há mais de 70 anos".
A ordem para demolir não se aplica à casa que dá para a rua. O camartelo só paira sobre os acrescentos no logradouro, incluindo as precárias "instalações sanitárias" no lado oposto do caminho, retrete em cimento e alguidar de plástico para banhos na parede.
O presidente da Junta de Freguesia de Campolide, Jorge Teixeira dos Santos (PSD), estima em 26 os fogos ameaçados, afectando cinco dezenas de moradores. O autarca concede que a encosta está instável, mas não em "risco iminente". Como prova aponta o licenciamento recente de um prédio com quatro pisos no topo da escarpa. Na maioria dos casos, após décadas ali a residir, defende, "a câmara tem obrigação de assegurar o realojamento dos moradores ao abrigo do PER de emergência".
O assessor de imprensa da autarquia afirma que compete aos senhorios "o realojamento dos moradores que tenham contratos de arrendamento em vigor". O realojamento, diz, seria "um precedente perigoso", porque não é vocação do município "realojar permanentemente inquilinos de senhorios particulares".»
in Público

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